Se me é permitido, Senhor, falar com os mortos (que na verdade não acredito que estejam mortos, mas sim vivendo em outros mundos ou na espiritualidade), gostaria de falar com Clarice... Isso mesmo, com Clarice Lispector. Ela, que tanto escrevia e que através da escrita, assim como eu, buscava respostas para suas indagações, para suas dúvidas, para a sua vida...
Eu entendo quando ela diz que vive (porque Clarice ainda vive) “no quase, no nunca e no sempre”, porque muitas vezes vivemos entre o limite do que gostaríamos de realizar e do que realmente vivemos... Sem falar do quanto é difícil viver no real, no presente e no agora... A maior dor do ser humano está na realidade, em encarar a realidade dos fatos. Muitas vezes é mais fácil viver na ilusão que enfrentar a realidade das coisas... Por outro lado, viver só de ilusão também não é uma boa alternativa, vive assim quem se engana e tenta enganar aos outros, mas vive infeliz porque, no fundo, sabe a realidade da vida.
E Clarice também sabia a realidade, por isso nunca se enganou. Ela escrevia para tentar entender ela mesma e o mundo que a cercava, buscava, na junção das palavras, explicações para os seus próprios pensamentos. E é isso que eu também procuro fazer ao escrever, tentar me entender. E entender tudo o que se passa pela minha mente, os meus próprios pensamentos, os pensamentos que absorvo do universo, os pensamentos dos grandes escritores que ficaram registrados nos livros, enfim, todas as informações que recebo do mundo e que me transformaram em quem eu fui no passado, em quem eu sou hoje e que me transformarão em quem eu serei no futuro...
Eu queria ter sido amiga de Clarice, pois sem saber, ela é minha amiga, porque me faz pensar sobre as coisas, refletir sobre mim, buscar explicações para a vida e encontrar respostas para as minhas dúvidas.
Clarice escrevia com facilidade, as palavras simplesmente fluíam... Para mim, escrever não é tão fácil assim... Eu, muitas vezes, me perco entre o tempo dos pensamentos e do ato de escrever... Tudo é tão rápido que ao ligar o computador ou pegar uma caneta para tentar registrar o que acabei de pensar não dá tempo... Quando tento escrever os pensamentos percebo que eles já se foram... O que me faz pensar que nem tudo o que eu penso pertence a mim, mas ao mundo, e por isso não tenho direito de registrá-los em meu nome, apenas usufruir daqueles breves momentos em que eles passaram por mim, mas se foram, pois, na verdade, não eram meus...
Então entendo que os únicos pensamentos verdadeiramente meus são esses que sou capaz de registrar, de escrever e de mudar quantas vezes achar necessário antes de publicá-los.
Eu ainda não li a obra completa de Clarice. Na verdade, nem sei quantos livros dela eu tenho ou já li... Alguns eu li inteiros, outros leio por partes. Alguns entendo, outros não, porém fico refletindo sobre o que ela quis dizer com eles... Mas sempre que releio um texto de Clarice é como se estivesse lendo outro texto, pois faço uma releitura, descobrindo detalhes que na leitura anterior ficaram perdidos nas entrelinhas... Para mim, é como se tivessem sido reescritos...
Eu não entendo muito de Clarice, mas gosto de tudo o que leio, porque gosto das pessoas que eu não entendo e, sendo assim, me fazem pensar... Normalmente, não me atraio por pessoas muito óbvias... E Clarice é sempre surpreendente. Eu, cada vez que leio os seus textos me torno outra, pois me enriqueço com as suas dúvidas e com a sua sabedoria. Em Clarice eu sempre encontro inspiração para continuar escrevendo... E esperança de, além de encontrar minhas respostas, ser lida e compreendida.
Clarice tinha dúvidas se continuaria sendo lida e lembrada após a sua morte... Eu queria poder contar a ela que sim! E que, além disso, ela se tornou um mito!
Quando ela morreu eu tinha apenas 5 anos e nem sabia de sua existência, então, não sofri com a despedida, pois, para mim ela não aconteceu. Mas hoje, 35 anos depois, ao ler seus textos eu sofro. Sofro por, humildemente dizendo, me identificar com suas dúvidas e seu modo estranho de pensar... E as dúvidas sempre me fazem sofrer... Sofro porque ela se foi sem encontrar todas as respostas e eu fiquei aqui, com as minhas dúvidas e com as delas... Mas, ao mesmo tempo, tenho a única certeza que, talvez nos aproxime, escrever é preciso! Por isso, “enquanto eu tiver dúvidas e não houver respostas, continuarei a escrever”...
6 comentários:
Salve Lu!
O que mais gostei no seu texto foi que mais do que falar sobre Clarice, vc falou de você.
Se há algo que vc escreve que vc sente que não é seu, que vc não tem o direito de colocar seu nome,como vc disse sentir as vezes, o q Clarice escreveu talvez possa ser assim tb, pq não?
Este semestre tive q ler bastante correspondências entre autores, dentre eles Clarice, é surpreendente! Se algum dia se interessar...
Um grande abraço.
Oi Rafa!!
Obrigada! Fico feliz que tenha gostado! Ao terminar o texto eu logo pensei em você e na opinião que você teria ao ler...
Sim, eu também acredito nisso... Mas é estranho me comparar à Clarice, porque ela é incomparável... Porém, eu sempre falo de mim... E isso ela também fazia...
Adoraria ler essas correspondências de Clarice!! Se puder me passar, ficarei grata!
Um grande beijo!
Lu,
O texto ficou muito legal! Parabéns!
Ká
Oi Kaká!!!
Um elogio vindo de você me deixa muito feliz!!! Minha consultora de assuntos gramaticais... rs.
Muito obrigada!!! Saudade de você!
bjs
Não entender me deixa mais completa, diria Clarice. Beijo, Lú!
Oi Vaccari!!
Bom saber que passou por aqui!!
Muito propício o seu comentário!
Grande beijo e obrigada pela visita!
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